‘Sofri antes da Olimpíada’, diz Ana Marcela quatro meses após cirurgia
Submetida a corticoides e retirada do baço, nadadora relembra drama às vésperas da Rio-2016, foca em Tóquio-2020 e afirma não temer falta de estrutura diante de crise na CBDA
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A resistência mostrada nas provas de 10km nos mares pelo mundo precisou ser exibida em uma sala de cirurgia. Em outubro do ano passado, Ana Marcela Cunha removeu o baço, no capítulo final de um drama que a preocupava desde antes dos Jogos do Rio.
No final da preparação para o evento, a nadadora descobriu que tinha uma doença autoimune que causa destruição das plaquetas, chamada PTI. Um susto para uma potencial medalhista de ouro do Brasil na época, credenciada por sete láureas em Campeonatos Mundiais.
Ao LANCE!, a baiana contou detalhes do episódio, admitiu a apreensão antes da Rio-2016, quando terminou apenas em 10º lugar e viu Poliana Okimoto levar o bronze, disse confiar em um ciclo com estrutura, apesar da crise na Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA), e garantiu estar focada em Tóquio-2020.
Ana Marcela viaja nesta segunda-feira para a etapa de Abu Dhabi (EAU) da Copa do Mundo, a segunda na temporada. Em fevereiro, ela ficou em quinto em Viedma (ARG), no seu primeiro compromisso após a recuperação.
LANCE!: Como está a sua vida agora, de volta às competições?
ANA MARCELA: Estou com a saúde 100%, graças a Deus. Já nadei etapa de Copa do Mundo, em Viedma, quando cheguei em quinto. Parecia a primeira prova da minha vida. Bateu o nervosismo por voltar a fazer o que a gente ama novamente. Fiquei muito feliz. Nem esperava o resultado que tive, por mais que não fosse uma prova tão cheia, com muitos atletas de ponta. Mas conta, pois era internacional. A próxima etapa é uma das mais fortes antes do Mundial de Budapeste (HUN) e servirá como preparação para a seletiva nacional.
L!: Você até raspou o cabelo depois da cirurgia. O que motivou a decisão?
AM: Fiz a cirurgia no dia 22 de outubro. Durante uma semana, os exames mostravam que estava tudo bem. Resolvi que, a partir dali, seria uma nova vida. Estava tudo recomeçando. Quero voltar 100% à minha carreira. Eu brinquei que nós nascemos sem cabelo, então raspei e, agora, está voltando a crescer aos pouquinhos.
L!: Como foi a descoberta do problema e a recuperação?
AM: Antes da Olimpíada, quando o problema foi diagnosticado, comecei a tomar corticoide. Até uma semana depois da cirurgia, continuei tomando, em menores doses. Depois, a médica já cortou, e as plaquetas permaneceram normais, o que era a maior preocupação. Hoje, está tudo bem, sem indícios de problemas. Foi uma cirurgia super bem feita.
L!: Você sempre disse que a doença não interferiu no seu desempenho na Rio-2016 (ficou em 10º lugar). Mantém essa posição?
AM: Eu estava preparada. Lógico que o corticoide não é bom. Mas em nenhum momento quis deixar que isso me atrapalhasse. Não gosto de desculpas. Sou uma atleta que jamais vai culpar uma doença. Mas todo mundo sabe o que aconteceu na prova. Em uma das hidratações, perdi. Assim como não darei desculpa se um dia eu ganhar, tenho de bater a cara e ser verdadeira. Não adianta mentir para vocês, que no futuro vocês descobrem algo (risos).
L!: Depois de uma Olimpíada em casa, uma sensação única, como fica a expectativa para Tóquio-2020?
Olimpíada é Olimpíada. Não importa o local, você quer estar lá. Fico feliz que a última foi em casa e que pude participar. Não foi o resultado que eu queria, mas foi bom. Querendo ou não, confesso que sofri antes da Olimpíada por causa do problema de saúde que descobri. Precisei colocar a cabeça para o alto nos meus treinamentos. Tive uma infelicidade na prova. Mas é nessas situações que o atleta se cria. Agora, é preparar etapa por etapa para o Japão.
"Querendo ou não, confesso que sofri antes da Olimpíada por causa do problema de saúde que descobri. Precisei colocar a cabeça para o alto nos meus treinamentos. Tive uma infelicidade na prova. Mas é nessas situações que o atleta se cria" - Ana Marcela
L!: Como está a sua situação de patrocínios? Você sofreu cortes?
AM: Todos os contratos que assinamos tinham data de vencimento, então acho que ninguém foi pego de surpresa. É claro que espero que outras empresas apareçam, como a Nissan confiou no meu trabalho para 2020 novamente. Isso é o importante. Mostrei que, independentemente de um resultado ruim (nos Jogos do Rio), tenho uma imagem forte, boa. Felizmente, nunca tive nenhum problema com a mídia, o que é um ponto forte. Sou uma atleta que respeita sempre o próximo. O mesmo vale para os outros esportistas que fazem parte do Time Nissan junto comigo. O que aguardo, agora, é uma resposta dos Correios, por meio da nossa confederação. Mas temos de esperar a definição. Não tem jeito.
L!: Falando nisso, o cenário de incertezas da CBDA, com redução de patrocínio para o novo ciclo e a proximidade das eleições, te preocupa?
AM: Só o que tínhamos de ajuda da confederação era o patrocínio dos Correios, que, além pagar as viagens, nos davam uma grana. No dia a dia, nos treinamentos e na estrutura, não tem diferença. É claro que é um dinheiro que hoje não entra mais em nossas contas. Faz falta. Mas não podemos usar isso como desculpa em caso de maus resultados.
L!: Já houve alguma mudança na preparação neste início de ano?
AM: Estou focada nos treinos na Unisanta, meu clube. Por enquanto, não tem nada diferente, como em 2016, quando eu viajava direto ao Rio para treinar no palco olímpico.
NÚMERO
3
Prêmios de melhor atleta do ano da Federação Internacional tem Ana Marcela: 2015, 2014 e 2010.
QUEM É ELA
Nome
Ana Marcela Cunha
Nascimento
24/3/1992, em Salvador
Altura e peso
1,63m/64kg
Currículo
Três vezes eleita a melhor do mundo pela FINA e eleita a Atleta do Ano de 2015 no Prêmio Brasil Olímpico, a baiana é a brasileira com o maior número de medalhas em Campeonatos Mundiais, com sete (tem no currículo dois ouros nos 25km, duas pratas, nos 5km por equipes e nos 10km, e três bronzes, sendo dois nos 5km e um nos 10km). Em Pequim-2008, ficou em quinto nos 10km.
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