Dar o seu melhor dentro de campo! Rony prepara lema no Palmeiras para a Seleção Brasileira
Após calar questionamento com conquistas, atacante palmeirense alcança o seu auge sendo lembrado para vestir a Amarelinha
Em uma das entrevistas que concedeu no fim do ano passado, Rony não se conteve. Foi pedido para que ele se definisse em uma palavra, mas ele disse logo uma frase: ‘Dar o seu melhor dentro de campo’. Se isso virou motivo de piadas e memes para muita gente, inclusive companheiros de Palmeiras, não é errado dizer que ele tinha a sua razão. Dar o seu melhor dentro de campo foi o que definiu o jogador desde o seu primeiro dia no clube alviverde.
Paraense, da pequena cidade de Magalhães Barata, que possui menos de 10 mil habitantes, o atleta se tornou a segunda contratação mais cara da história do Verdão quando chegou ao clube, no início de 2020. A diretoria palmeirense pagou algo em torno de R$ 28 milhões para tirar o atacante do Furacão e colocá-lo no lado verde da força.
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O momento de Rony era incontestável. Campeão da Copa Sul-Americana, em 2018, e da Copa do Brasil, em 2019, pelo Athletico-PR, sendo protagonista em ambas as conquistas, ele chegava ao Palmeiras com a missão de levar o clube de volta às conquistas, o que não havia acontecido na temporada anterior à sua chegada.
A ausência de títulos em 2019 levou o Palestra a um choque de gestão. Saiu o diretor de futebol Alexandre Mattos, considerado por muitos o grande responsável pelo sucesso palmeirense entre 2015 e 2018, época em que foram conquistados dois Campeonatos Brasileiros (2016 e 2018) e uma Copa do Brasil (2015), e chegava Anderson Barros
Se com Mattos a política era contratar em baciada, Barros tinha um perfil mais discreto no mercado. Com o novo homem forte do futebol palestrino também veio uma nova filosofia: fim das chamadas grandes contratações e início nas apostas dos jovens. O Palmeiras vivia um grande momento nas competições das categorias inferiores, fruto do ótimo trabalho de reestruturação da base feito pelo diretor João Paulo Sampaio. Assim, diferentemente do que havia acontecido no início das quatro temporadas anteriores, o 2020 do Verdão começou com poucos reforços. Foi assim com Rony.
CHEGADA DE RONY AO VERDÃO
Mesmo chegando gabaritado ao Palmeiras, com dois títulos importantes pelo Athletico-PR, nas duas temporadas anteriores, o atacante sentiu o peso da cobrança logo de cara. O momento não era de muitos investimentos. Assim, quem chegava já carregava consigo a pressão de ter sido uma compra assertiva. Principalmente quando se tratava de um atleta no qual o clube pagou 6 milhões de euros.
Logo no segundo jogo com a camisa alviverde veio a primeira assistência. E em uma partida da Libertadores, contra o Tigre, na Argentina. Foi o primeiro capítulo de uma história de amor do atacante com a competição continental. Era ela, inclusive, a taça que faltava na nova era palmeirense, chamada por alguns como Terceira Academia, e que começou em 2015. Foi a ausência da Liberta o motivo principal para a saída de Alexandre Mattos. O Verdão vinha disputando todas desde de 2016, mas não conseguia gritar ‘é campeão’.
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2016: eliminação na fase de grupos
2017: eliminação para o Barcelona (ECU), nas oitavas de final
2018: eliminação para o Boca Juniors (ARG), na semifinal
2019: eliminação para o Grêmio, nas quartas de final
A última, inclusive, foi a mais sentida, já que o Palmeiras venceu por 1 a 0 em Porto Alegre, abriu o placar no jogo de volta, em São Paulo, e tomou a virada em quatro minutos. O gol qualificado deu a classificação aos gaúchos.
As assistências dadas por Rony no segundo e quarto jogo dele pelo Verdão, sendo ambas em confrontos válidos pela Libertadores, animaram, mas não empolgaram. A torcida queria ver o gol do reforço. E ele demorou para sair.
Muito mais do que os sete meses que separaram a estreia do primeiro tento, o desencanto durou o tempo de uma pandemia inesperada, que parou o futebol brasileiro por quatro meses, durou mais de dois anos e assistiu a volta por cima de um jogador que começou em baixa naquele que era para ser o seu melhor momento na carreira.
PARA VIRAR A CHAVE FOI NECESSÁRIO SE TORNAR RÚSTICO
O surto do coronavírus pegou o mundo de surpresa e abalou também o mercado financeiro, tornando possível muita coisa que parecia inimaginável. Libertadores fora da Rede Globo na televisão aberta? Libertadores transmitida pelo SBT? Sim, aconteceu.
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O narrador Téo José, que já havia transmitido alguns jogos do Palmeiras naquela edição da Liberta, mas pelo Fox Sports, foi contratado para ser a voz do Sistema Brasileiro de Televisão na retomada do canal com o futebol. Téo, que costumeiramente utiliza referências musicais nas suas narrações, intitulou Rony como Rústico, em referência à canção ‘Betty Frígida’, da banda Blitz.
A música é iniciada como uma assinatura de um filme de cinema e fala sobre a relação de Betty com Rony Rústico em meio às suas diferenças físicas e comportamentais. Em dado momento da canção, Betty diz para Rony: ‘A gente pode tentar outra vez’. Mal sabia o jogador e a torcida palmeirense que isso estava acontecendo.
E assim, a Taça Libertadores, que para o torcedor palmeirense é cantada, contada e tratada como obsessão, para Rony se tornou transformação.
O ESPERADO PRIMEIRO GOL
O então camisa 11, que havia feito cinco jogos pelo Palmeiras até a pausa do futebol, por conta da pandemia, entrou em campo mais 16 vezes até deixar a sua marca pela primeira vez. Neste meio tempo, ele já tinha sido até campeão Paulista pelo Verdão, vencendo a final contra o Corinthians e sendo titular nos dois jogos decisivos, mas nada de desencantar.
Nas redes sociais, já circulava a brincadeira que faltavam 100 gols para que Rony alcançasse a marca do centésimo gol com a camisa palmeirense. Mas, na prática, a zoeira era uma forma de disfarçar a insatisfação da nação palmeirense com a ausência de bolas na rede de um atleta que, até aquele momento, só não tinha custado mais caro do que o Borja - e a referência ao colombiano já era péssima por si só, pois ele não correspondeu o valor investido pelo Alviverde.
O primeiro tento do Rústico com a camisa alviverde aconteceu no dia 16 de setembro de 2020, no Allianz Parque. Naquela data, o Verdão goleou o Bolívar, da Bolívia, por 5 a 0, e o último gol foi anotado pelo atacante. Festa e mortal para trás, marca simbólica das comemorações de Rony, que se repetiram 50 vezes mais até aqui. E se antes faltavam 100 gols para que o jogador chegasse ao centésimo gol pelo Palmeiras, metade do caminho agora já foi andado para que o atleta atinja a marca.
Antes de ir às redes, o encontro do Verdão contra o Bolívar fora de casa, pela Liberta, já havia trazido um presságio. Desde a assistência no jogo contra o Guaraní, do Paraguai, na segunda rodada da fase de grupos da Libertadores, antes da pandemia, Rony nem participava diretamente de gols. Em La Paz, contra o mesmo time boliviano que ele viria anotar o seu primeiro tento pelo Palmeiras, o atacante palmeirense deu a assistência para um golaço marcado por Gabriel Menino. Cinco jogos depois, o garçom deixou a sua marca.
RONY E ABEL FERREIRA
Naquele momento, Rony já era questionado internamente. Vanderlei Luxemburgo era o treinador e já não bancava mais tanto o jogador, que passou a comer bastante banco, entrando mais nos segundos tempos, mas em algumas ocasiões nem entrando.
No dia 14 de outubro de 2020, Luxa foi demitido após uma derrota para o Coritiba, em casa, Brasileirão. No jogo seguinte, Rony não saiu do banco de reservas. Depois, entrou faltando 20 minutos para o fim do duelo contra o Tigres, pela Libertadores, Tempo suficiente para ele marcar o seu segundo gol pelo Palmeiras e também dar uma assistência. A atuação do atacante contra os argentinos o credenciou a voltar a ser titular nos dois jogos seguintes, contra Atlético-GO e Atlético-MG, pelo Brasileirão, e Red Bull Bragantino, na partida de ida das oitavas de final da Copa do Brasil. Contra o Galo, Rony deixou a sua marca, e o Verdão venceu por 3 a 0 a equipe que era comandada por Jorge Sampaoli.
Rony foi titular e atuou durante 90 minutos na estreia de Abel Ferreira como técnico palmeirense, no dia 5 de novembro. Na ocasião, o Palmeiras, que já havia encaminhado uma boa vantagem no jogo de ida das oitavas de final da Copa do Brasil ao vencer o Bragantino por 3 a 1, fora de casa, foi econômico e bateu o Massa Bruta somente por 1 a 0.
Os primeiros gols de Rony sob o comando de Abel Ferreira aconteceram no dia 25 de novembro. E, advinha: pela Libertadores. O atacante deixou a sua marca duas vezes na vitória palmeirense por 3 a 1 sobre o Defin, do Equador, pelo jogo de ida das oitavas de final da competição continental. Desencantou, pois no compromisso seguinte, contra o Athletico-PR, pelo Brasileirão, foram mais dois gols marcados e a ‘Lei do Ex’ executada com sucesso.
Foi assim que a confiança chegou, dando o seu melhor dentro de campo e tendo esse máximo extraído por Abel Ferreira. O treinador palmeirense sabe os atalhos para tirar tudo o que for possível dos seus atletas, e com Rony não foi diferente. Aplicação tática, correndo, fechando espaços e sendo decisivo com a bola nos pés, combinada com a versatilidade de atuar em todos os setores no último terço do campo, fizeram do Rústico um daqueles atletas que não saem do time do treinador português por quase nada.
- O Rony não vai ficar chateado. O Rony é nota 7 com bola. Se o Rony com bola fosse 9 ou 10, não estava no Palmeiras, estava no Barcelona, Bayern de Munique, e já há muitos times que o querem. Ele entrega muita coisa. Muitas vezes o segredo do jogador é saber isso, 'sou nota 7 nisso, nota 6 nisso'. Ele é bom tecnicamente, é só um pouco afobado - disse o técnico palmeirense em participação no podcast 90+3, da Conmebol, em março do ano passado.
SENHOR LIBERTADORES
Rony, então, passou a marcar gols com regularidade. O que era escasso virou frequente, principalmente na competição continental. Tentos anotados nas quartas de final, contra o Libertad, e na semifinal, contra o River Plate, na Argentina.
E se não bastassem as bolas nas redes, que estavam encaixando, o então camisa 11 palmeirense também tinha o seu lado garçom. Na sua primeira temporada pelo clube alviverde, foram 10 passes diretos para companheiros marcarem. Sendo o último daquela temporada 2020, que se encerrou no início de 2021, o mais especial.
Rony foi titular na final da Libertadores, contra o Santos, no Maracanã. Atuando pelo lado esquerdo, o atacante foi até o banco de reservas tomar água, já nos acréscimos do tempo regulamentar. A bola sobrou para ele, que cruzou na cabeça de Breno Lopes, que anotou o gol do título continental do Palmeiras.
Tornou-se assim o ‘Senhor Libertadores’, alcunha que só foi confirmada nas temporadas seguintes. Se 2020 serviu para confirmar o potencial de Rony, os anos que vieram depois o afirmaram. O bicampeonato veio em 2021, e em 2022, mesmo caindo na semifinal, o agora camisa 10 se tornou o maior artilheiro palmeirense na principal competição entre clubes na América do Sul, com 18 tentos anotados.
Na temporada passada, a América não veio, mas o Verdão, com o Rústico, conquistou o Brasil. O atacante foi parte fundamental para essa conquista - além dos títulos do Paulistão e da Recopa Sul-Americana, no primeiro semestre. Só em 2022, o jogador fez a mesma quantidade de gols que havia marcado nas suas duas primeiras temporadas pelo Palestra: 23 - além de seis assistências.
E 2023 já iniciou do mesmo jeito. Rony foi às redes cinco vezes em 10 partidas até o momento, tendo deixado a sua marca duas vezes no clássico contra o Corinthians e uma diante do Santos. O atleta passou em branco na Supercopa do Brasil, contra o Flamengo, mas foi titular e conquistou mais um caneco para a sua coleção com o Alviverde. Tudo isso dando o seu melhor dentro de campo. Esforço tão grande que rompeu a Academia de Futebol e, fruto do reconhecimento, chegou à Seleção Brasileira. Rony vestirá a Amarelinha. E isso já tem data marcada para acontecer: 25 de março, no amistoso contra o Marrocos, no país africano.
Final feliz e completamente merecido para uma história que só não é digna de filme ou série ou sonho, porque se tornou realidade, fruto de trabalho, esforço e suor de quem é muita coisa para se definir em apenas uma palavra ou na teoria. Rony, o Rústico, é aplicação prática do que é dar o seu melhor dentro de campo.
- Não passa um filme, mas uma série de coisas que você vivenciou no passado, com todas as dificuldades, desconfianças e você vê que conseguiu realizar um sonho de criança, da família, principalmente, e eu falo que não só os meus familiares, mas, principalmente, a Deus, que está me proporcionando tudo isso, com apoio dos meus familiares, com ajuda da minha equipe, da comissão técnica, do professor Abel, eu consegui sonhar e realizar esse sonho, que é vestir a camisa da Seleção Brasileira e representar o meu Estado e, principalmente, o meu país. Para mim, é a realização de um sonho - disse Rony à comunicação do Palmeiras após a convocação.