‘Meta é difícil, mas estamos preparados’, aposta dirigente do COB
Jorge Bichara, Gerente de performance do Comitê Olímpico, vê Brasil forte na Rio-2016, acha viável desafio de ficar no top 10 mas evitar fazer projeções de número de medalhas
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Esta noite, quando a delegação do Brasil estiver entrando no desfile das delegações da cerimônia de abertura da Olimpíada Rio-2016, a atenção de um dos integrantes do COB (Comitê Olímpico do Brasil) passará muito longe do clima de festa no Estádio do Maracanã. Envolvido em planilhas e relatórios, Jorge Bichara, gerente geral de performance esportiva da entidade, está consciente de que seu trabalho está longe do final.
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– Quando alguém vira para mim e diz que agora o trabalho está concluído e a responsabilidade pertence aos atletas, pois os Jogos vão começar, eu respondo que muito pelo contrário. É agora que vamos trabalhar ainda mais – afirma Bichara, que vai para sua terceira Olimpíada traçando todos os detalhes da participação dos atletas brasileiros, repetindo o que já fez em Pequim 2008 e Londres 2012.
Para a Rio-2016, o trabalho de Bichara foi ainda mais árduo. Além da responsabilidade natural de competir em casa, o Brasil terá ainda como desafio alcançar a meta estabelecida pelo COB de terminar os Jogos na 10 posição no quadro geral de medalhas. Uma meta ousada, mas que na opinião de Bichara, poderá ser alcançada.
– Adoro isso aqui, me estimulo com a Olimpíada, são quatro anos da pensando nela. Vivo a mesma ansiedade dos atletas para que chegue logo o dia 6 e ver as competições começarem. A meta é difícil mas é possível. Só posso dizer que a gente vai chegar bem preparado.
Confira abaixo os principais trechos da conversa de Jorge Bichara com o LANCE!
L!: Você chega para os Jogos do Rio-2016 satisfeito com a preparação realizada pelo Brasil ou acredita que tinha algo que dava para melhorar ?
JORGE BICHARA: Nós chegamos nesta fase satisfeitos com o que foi feito, chegamos confiantes de que teremos uma boa participação nesta Olimpíada. Chegamos com número de atletas lesionados pequeno, o que foi motivo de muita satisfação, porque foi uma preocupação em determinado momento deste ciclo olímpico, onde as lesões eram muito grandes, pois isso é normal em esporte de alto rendimento. Ficamos satisfeitos com as condições finais de preparação de todas as modalidades, mas se me perguntarem se dá pra melhorar, responderei “sim”, sempre dá para melhorar. A gente tem que buscar a melhora sempre, todo dia, mas saímos bastante satisfeitos com o que fizemos até agora.
Acredita que meta do Brasil em ficar no top 10 no quadro de medalhas será alcançada? Acha possível de ser alcançada?
É uma meta muito difícil de ser alcançada, e ela foi estabelecida porque a gente precisava mudar de patamar, entendendo que vai trazer benefícios para a gente. A quantidade de países que disputam essa 10 posição é muito grande, talvez tenham dez países disputando essa posição. Algumas publicações preferem colocar a projeção em cima do número de medalhas de ouro, mas como não é um conceito que consideramos ser o melhor em termos de avaliação, mantemos pelo quantitativo de medalhas. O Marcus Vinicius [superintendente do COB] costuma dizer que se a meta não for alcançada, ele dorme tranquilo em relação ao que foi feito. Eu penso da mesma forma.
Acha que o resultado final do Brasil será algo entre 25 a 30 medalhas? Esse é um número com o qual o COB trabalha?
Nas últimas semanas eu já olhei todos estes estudos que estão publicando. Só sei que um deles irá acertar (risos). Cada veículo publica um. Você não vai me ver falando de números. A gente tem os nossos estudos, avaliações de possibilidade e expectativas. Nosso principal objetivo quando começar a competição é chegar na final. A gente tem que avançar fases em várias modalidades e chegar na final. Esse é o nosso foco no momento. Parece uma coisa meio óbvia, mas as coisas simples são as mais difíceis de serem alcançadas mesmo. Só teremos chance de ganhar mais medalhas se disputarmos um maior número de finais.
Como vocês realizaram o trabalho de gerenciamento de performance dos atletas brasileiros neste ciclo olímpico?
Desenvolvemos uma ação planejada em cada esporte em todo ciclo olímpico, verificando onde existia potencial de bons resultados, não esquecendo que precisávamos deixar uma proposta de legado para o próximo ciclo. Foi criado um plano estratégico desde 2009 com participações em competições internacionais, ganho de nível dos atletas etc, com o objetivo de deixá-los na melhor condição de treinamento.
Em relação à meta de resultados estabelecida pelo COB, quais foram as maiores dificuldades que vocês enfrentaram neste ciclo olímpico?
A estrutura do Brasil é baseada em clubes. Acreditamos pelo último ciclos que isso deu uma melhorada na nossa realidade. Foram feitos investimentos em novas instalações, reformas de universidades etc , mas precisamos melhorar a mão de obra que vai atuar em todos os setores, como treinadores, fisioterapeutas, médicos, pessoas que prestam serviço para a área esportiva. Espero que possamos melhorar a qualidade do treinamento esportivo do Brasil.
A quantidade de atletas formados no Brasil é suficiente para pensarmos em um país de mentalidade olímpica?
Ainda temos um número reduzido de atletas em alto rendimento no Brasil e com isso a peneira ainda é reduzida, o o processo seletivo em algumas modalidades é pequeno com atletas em condições de dar resultados em competições internacionais. Gostaríamos de ter mais atletas. Mas é necessário que as políticas públicas venham a contribuir com isso. A gente precisa de mais brasileiros praticando atividades físicas, para que depois a gente tenha mais crianças e jovens praticando um esporte formal, qualquer um, para depois pensar em esporte olímpico e de alto rendimento. Essa sequência poderá aumentar o número de praticantes.
Como está a preocupação de vocês com o uso das redes sociais pelos atletas nesta Olimpíada?
Trabalhamos para buscar a conscientização dos atletas dos riscos e prejuízos que o uso excessivo das redes sociais poderem trazer para eles em termos de performance. Em todas os contatos que estabelecemos com eles, nos programas de integrações, nas palestras, em todos estes encontros trouxemos exemplos de outras situações que outros atletas vivenciaram e que pelo uso excessivo de exposição trouxe algum tipo de prejuízo de performance. Não proibimos o uso, o próprio COI (Comitê Olímpico Internacional) estimula o uso de mídias sociais. Nós não proibimos, desde que o atleta o faça no momento certo, se comunique de forma correta, sem receber e absorver um retorno negativo que as vezes existe. Quando ele se abre para se comunicar com todo o mundo, se expõe para receber um leque enorme de críticas que podem mexer com seu lado emocional.
Foi o caso da Rafaela Silva na Olimpíada de Londres?
Sim o caso dela é um exemplo que naquele momento prejudicou não a sua performance, que já havia acontecido, mas o próprio emocional do atleta, fragilizado em razão de um resultado ruim, e que acarretou uma série de discussões que foram para um lado chato de discriminação, racismo etc. Esse caso serviu de ensinamento para nós, além de pegarmos exemplos sobre privação de sono, criando situações onde você poderia prejudicar sua performance esportiva. Isso mereceu nossa atenção.
Falando especificamente de modalidades, o atletismo, a despeito do alto investimento feito pelo COB, CBAt e o governo federal, fez um Campeonato Mundial de 2015 abaixo do esperado. Qual a expectativa em relação ao que será apresentado nos Jogos do Rio-2016?
O atletismo carrega um simbolismo grande, é a base dos Jogos Olímpicos, há uma distribuição grande de medalhas e tem sido a mais pluralizada possível, muitos países conquistando cada vez mais medalhas. Nossa história é com a conquista de um número reduzido de medalhas, uma ou duas no máximo, sendo que em Londres 2012 infelizmente não tivemos medalhas. Desenvolvemos com a confederação um programa de preparação buscando aumentar o número de atletas e se numa equipe numerosa aqui no Rio de Janeiro. Alguns bem jovens tendo primeira participação olímpica. Chegamos com boas perspectivas de alcançar várias finais, como no salto com vara, na marcha atlética, boas perspectivas de alcançar finais nos revezamentos, especialmente feminino... a partir do momento que alcançarmos as finais, a nossa realidade de conquista de medalha pode aumentar.
Existe uma preocupação sobre o que vai acontecer após a Rio-2016 em termos de investimento. O que o COB pensa sobre isso?
A vida não termina no dia 21 ou 22 de agosto, tudo vai continuar. Mas sim, é uma questão de atenção e preocupação pra gente no que vai acontecer em termos de investimentos. Naturalmente se espera uma retração mais do mercado privado do que do público, o país vive um momento de dificuldade em vários setores e é natural que você reveja a questão dos investimentos esportivos. Esperamos que cada vez mais o esporte olímpico seja um plano de estado e que a gente consiga que os investimentos sejam mais consistentes. Desenvolvemos um plano de legado junto à prefeitura do Rio, em relação ao uso de instalações esportivas sob o aspecto técnico-esportivo. Entendemos que se tivermos um produto bom, atletas de qualidade, demonstração de um trabalho profissional e com competência, as empresas terão interesse de permanecer vinculadas ao esporte. Sabemos que nós vivemos sempre avaliados pelo resultado, gostaríamos que a avaliação não fosse apenas por isso mas por todo um trabalho desenvolvido.
O COB já fez uma análise dos prós e contras a respeito do afastamento de mais de 100 atletas russos por causa do doping? Em quais modalidades isso é bom para o Brasil? Em quais não é?
Já fizemos alguns estudos e a modalidade mais afetada com esse afastamento é o atletismo. Sem a [Elana] Isinbayeva, que é uma atleta muito forte, existe um grande impacto no salto com vara, ela iria entrar em disputa de medalha muito forte. A ausência dela tem impacto grande, porém abre perspectiva para outros países ocuparem essas posições. No atletismo, existiam estudos que indicavam que os russos tinham uma expectativa de conquista de seis a oito medalhas. Agora, dizer que essa medalha irá migrar para o país A, B ou C é difícil. O levantamento de peso é uma modalidade na qual o afastamento dos russos teve um impacto de certa foma favorável ao Brasil. Na canoagem velocidade, o afastamento de atletas russos, da Romênia e Belarus causa num primeiro momento um cenário positivo, mas em determinadas provas, a entrada de atletas alemães e da Moldávia em uma prova específica que é o C2 1000, para a gente quase que equilibra essa entrada e saída. É um joguinho de xadrez difícil.
Se no dia 22/8, no quadro de medalhas o Brasil tiver terminado em 11º ou 12º, mas que já seja a melhor campanha histórica do país nas Olimpíadas, vocês ficarão satisfeitos com esse resultado? Ou vocês terão um sentimento de decepção com este resultado?
Estas avaliações a gente só consegue fazer no final. Temos uma Olimpíada toda pela frente para avaliar como será a performance do Brasil. A expectativa de uma performance muito boa, mas o processo de avaliação será feito somente no final.
Colaborou: Guilherme Cardoso
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