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Isolado e sem confiança: últimas impressões de Ceni como técnico

Perfil 'workaholic' e auxiliares estrangeiros foram apontados como problemas para o treinador em últimos dias no cargo e diretoria chegou a dizer que quis preservar o ídolo

Rogério Ceni ainda não era técnico de futebol
Reprodução

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Na última terça-feira, Rogério Ceni foi ao CT da Barra Funda para se despedir dos jogadores e, agora, ex-colegas de comissão técnica, colocando um fim definitivo em sua passagem como técnico no São Paulo. E a impressão que deixou nos últimos dias, mesmo sem ser de forma unânime, é de que terminou a experiência isolando-se com seu auxiliares estrangeiros e sem despertar tanta confiança.

O estilo "workaholic" do treinador, contrário a qualquer distração ao trabalho, foi algo que ele mostrou desde os primeiros dias e que, ao fim de seis meses, cansou alguns atletas, embora isso despertasse admiração. Além disso, a dificuldade de comunicação dos auxiliares estrangeiros trazidos por ele também é um obstáculo apontado em sua passagem.

Isolado

Rogério Ceni trouxe o auxiliar inglês Michael Beale e o francês Charles Hembert com a ideia de implantar de vez um estilo inovador e moderno em seu time do coração. O projeto ganhou aplausos, mas a empolgação dos envolvidos foi diminuindo à medida que o time perdia força em campo.

Um ponto vital apontado por profissionais no CT da Barra Funda foi Beale ter desistido de aprender português. Tornou-se alguém incomunicável aos jogadores e dirigentes. Ceni teve trabalho dobrado, porque era um dos poucos que falava com o inglês, que passou a ganhar antipatia por passar a impressão de falta de esforço.

Neste ponto, o "vício" do técnico em trabalho também atrapalhou. Ceni estava tão focado em montar treinamentos e avaliar adversários que ficava tempo demais com seus auxiliares estrangeiros. Houve até um distanciamento do ex-volante Pintado, membro permanente da comissão técnica.

Não era à toa que o ídolo falava tanto em números após seus primeiros jogos. Foi necessário ser muito criticado após as eliminações no Campeonato Paulista, na Copa do Brasil e na Copa Sul-Americana, todas em um intervalo inferior a um mês, para, enfim, dar ouvidos aos conselhos que recebia de dentro e de fora do clube para passar uma imagem de que constatava o mau momento.

O zagueiro e amigo Lugano cansou de lhe falar para aprender a "encantar serpentes", que significava agradar imprensa e torcida em suas declarações. O uruguaio foi um dos profissionais mais próximos de Ceni em seus seis meses como técnico e sempre se preocupava em como ajudá-lo. O camisa 5 sentia que o isolamento natural do ídolo poderia lhe trazer problemas.

Falta de confiança do elenco

É necessário ressaltar que nenhum jogador esperava a demissão de Rogério Ceni nem mesmo o considerava um técnico aprendiz. O ex-goleiro preparava treinamentos diferentes no dia a dia e parecia, sim, estimular seus comandados. Mas dois episódios evidenciam um distanciamento do chefe de alguns de seus atletas.

Na pré-temporada nos EUA, jogadores aproveitaram um período de folga para ir a parques de diversões e alguns dos mais novos, encantados com o lazer, abordaram Ceni dizendo que o técnico deveria ter ido com eles. O ex-goleiro ficou no hotel com seus auxiliares, focado nas atividades que comandaria, e, segundo relatos, se irritou com os comentários. Esbravejou que a viagem era para trabalhar e quis antecipar a explicação de treinamentos.

Há algumas semanas, em meio às críticas pela falta de resultados na temporada, Ceni reclamou com os jogadores mais experientes que levavam seus filhos ao CT da Barra Funda. Dizia que isso tirava o foco dos treinamentos, mais uma vez fazendo com que seu estilo 'workaholic' o afastasse do grupo.

O caso do quadro que Ceni chutou nos vestiários do Morumbi, no intervalo de derrota para o Corinthians em abril, e que caiu em Cícero teve repercussão bem pequena entre os atletas. O episódio de fúria foi entendido como necessário naquele momento, já que era a ida das semifinais do Paulista e um clássico. O distanciamento se deu mais por preocupações em detalhes vistos como exageros, como nos episódios relatados acima.

A favor de Ceni, porém, esteve sua frequente tentativa de se aproximar de quem veio das categorias de base. O ídolo comprou a ideia da diretoria de usar melhor os garotos e gostava desse aspecto. Semanas antes de ser demitido, por exemplo, fez questão de bater papo particular com Denilson (atacante de 21 anos que veio do Avaí) e ensinou Brenner e Lucas Fernandes, recém-promovidos de Cotia, a baterem faltas.

Preservação do ídolo

A eliminação para o modesto Defensa y Justicia, da Argentina, na Copa Sul-Americana, em maio, foi a que mais gerou contestações a Ceni. Não só pela fragilidade do rival, mas por suas escolhas. Ele passou 17 dias apenas treinando e escalou João Schmidt, volante que já tinha definido sua saída para menos de dois meses depois, e Neilton, atacante dispensado logo após aquela partida.

Em relação a Neilton, pesa ainda o fato de que foi o próprio técnico quem indicou o jogador. Assim como fez com Cícero, e acabou insistindo com o meio-campista além do que parecia ser razoável para os dirigentes, que encaravam a atitude do ídolo como teimosia.

Aliado a isso, membros da diretoria e conselheiros próximos a Leco se queixavam de que o time estava piorando. Ceni não soube se reerguer após perder por 3 a 0 do Palmeiras, ainda no Paulistão, em março. Abria mão do estilo ofensivo e não resolvia nada atrás. A queixa era de que, enquanto era teimoso ao manter Cícero, o ídolo perdia qualquer tipo de identidade da equipe.

Fã de Rogério Ceni, o diretor executivo de futebol Vinicius Pinotti tornou-se o principal aliado do ex-goleiro. Mas, ao presidente Carlos Augusto de Barros e Silva, ficou a impressão de que o time passou a correr o risco real de rebaixamento. O mandatário usou todas as críticas que ouviu (e que concordava) para pôr fim à experiência do técnico com um discurso de "preservação do ídolo".

- De certa forma, protegemos uma figura histórica do São Paulo, um de seus maiores ídolos. Infelizmente, ele vinha sendo objeto de desgastes e considerações que a figura histórica de homem vitorioso não merecia e que não se compatibiliza com ele. Certamente, isso causou alguma comoção, contrariedade, mas também compreensão a muitos. A diretoria teve coragem em contratá-lo, sendo um novato no cargo, e lhe deu todas as condições e um pouco mais para trabalhar. E agimos para interromper uma trajetória descendente e desairosa para a história dele no São Paulo - justificou Leco em sua primeira entrevista após demitir Ceni.

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