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Didi: há 19 anos, o futebol se despedia do sereno ‘Príncipe Etíope’

Bicampeão do mundo com a Seleção Brasileira, o meia encantou torcidas de Fluminense e Botafogo e, posteriormente, marcou época como técnico em território peruano

Didi - Brasil
imagem cameraDidi ficou marcado por sua "folha seca" ao cobrar faltas (Foto: Reprodução)
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Lance!
Rio de Janeiro (RJ)
Dia 12/05/2020
16:47
Atualizado em 12/05/2020
19:18

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A maneira como o futebol brasileiro apresentou sua qualidade para o mundo passou pelos pés de Didi. Com serenidade na troca de passes e uma boa visão de jogo, Valdir Pereira saiu de cena em 12 de maio de 2001, deixando lembranças de títulos e grandes feitos por onde passou, além de ter como sua grande marca a "folha seca", cobrança de falta na qual a bola faz efeito até repousar mansamente no gol adversário.  

O dramaturgo Nelson Rodrigues, responsável por lhe dar o epíteto de "Príncipe Etíope", foi categórico ao discorrer sobre a elegância do camisa 8.

"Didi é, como um craque, um virtuose inexcedível. Trata a bola amorosamente. Ela parece, aos seus pés, uma orquídea rara e sensível, que deve ser cultivada com requinte e deleite", declarou, em crônica publicada na "Manchete Esportiva" de 4 de abril de 1959. 

Contudo, as façanhas de Didi já encantavam há muito tempo a torcida.

A PROJEÇÃO NO FLUMINENSE

Didi - Fluminense
No Fluminense, campeão da Copa Rio no time que tinha Castilho e Telê Santana (Foto: Reprodução)

Nascido em Campos dos Goytacazes, Didi passou por clubes como Americano, Lençoense e Madureira até, em 1949, o Fluminense lhe abrir as portas. Atuando ao lado de jogadores do quilate de Castilho, Telê Santana, Pinheiro, Orlando Pingo de Ouro e Quincas, desbravou caminhos e não demorou a se firmar.

Com o tempo, foi ganhando espaço também na Seleção Brasileira, na qual sagrou-se campeão dos Jogos Pan-Americanos em 1952. Na mesma época, havia vencido o Carioca de 1951 e a Copa Rio de 1952 pelo Tricolor das Laranjeiras. O desempenho no clube garantiu sua primeira convocação para uma Copa do Mundo, em 1954, mas o escrete canarinho amargou a eliminação nas quartas de final para a avassaladora Hungria. 

Em 1956, Didi mudou de ares e partiu para o Botafogo. Em General Severiano, viria uma história muito emocionante.

BOTAFOGO: UMA UNIÃO QUE FEZ BEM AO FUTEBOL BRASILEIRO

Garrincha, no Botafogo - Nilton Santos, Garrincha, Didi e Zagallo
'Todos eram muito unidos e passavam confiança para nós', afirma Amarildo sobre o quarteto Didi, Zagallo, Nilton Santos e Garrincha (Foto: Divulgação/BFR)

Contratado pelo Glorioso, Didi não demorou a fazer parte de uma geração emblemática. Seu antigo colega no clube e também na Seleção Brasileira, Amarildo tem grandes lembranças do Alvinegro.

- Do goleiro ao ponta esquerda, o time do Botafogo tinha jogadores fantásticos. Didi, Nilton Santos, Mané (Garrincha), Zagallo, Quarentinha... E todos sempre foram muito unidos, passavam confiança. Isto fez a diferença para a gente - recordou, ao LANCE!.

Em 1957, Didi já fez parte da equipe campeã carioca. Mas teria um sonho ainda maior para ser realizado.

DA 'FOLHA SECA' NO MARACA AO TÍTULO MUNDIAL NA SUÉCIA

1958 - Copa do Mundo - Didi e o Rei Gustavo
'Estava, fatalmente, por trás dos tentos alheios', disse Nelson Rodrigues sobre Didi (Foto: Reprodução)

Requisitado na Seleção Brasileira, Didi abriu caminho para o título mundial. Em 1957, o meia utilizou a "folha seca" para decretar a vitória por 1 a 0 sobre o Peru, no Maracanã, no jogo decisivo das Eliminatórias da Copa do Mundo. 

Com a vivência de já ter disputado um Mundial, coube a ele ser o ponto de equilíbrio do escrete de Vicente Feola. Embora tenha marcado só um gol (na goleada por 5 a 2 sobre a França, na semifinal), Didi conduziu as jogadas e passou serenidade até mesmo na final, quando o Brasil viu a Suécia abrir o placar. Pedindo calma aos atletas, ele contribuiu para que a virada para 5 a 2 fosse concretizada.

O dramaturgo Nelson Rodrigues trouxe seu ponto de vista sobre a atuação do "Príncipe Etíope" no Mundial.

"Nem sempre marcava gols. Mas estava, fatalmente, por trás dos tentos alheios. Era ele quem amaciava o caminho, quem desmontava a defesa inimiga com seus lançamentos em profundidade. Com uma simples ginga de corpo, liquidava o marcador. E nas horas em que os companheiros pareciam aflitos, ele, com calma lúcida, o seu clarividente métier, prendia a bola e tratava de evitar um caos possível", escreveu na "Manchete Esportiva" de 5 de julho de 1958.  

O grande desempenho fez com que ele despertasse a atenção do Real Madrid. Entretanto, os ciúmes que Di Stéfano teve dele encurtaram sua passagem no clube merengue e causaram sua volta a General Severiano pouco tempo depois.

Vestindo uniforme alvinegro mais uma vez ao lado de Garrincha, Nilton Santos, Quarentinha e Amarildo, Didi sagrou-se campeão carioca em 1961. No início do ano seguinte, conquistou o Torneio Rio-São Paulo. Porém, ainda havia um novo sonho a se concretizar.

O BICAMPEONATO MUNDIAL SE TORNA REALIDADE

1962 Brasil Garrincha, Didi, Pele, Vava e Zagallo
'Didi sempre foi uma pessoa muito afetuosa. Nunca o vi de cara amarrada', disse Amarildo (Foto: Reprodução)

Quatro anos depois do título na Suécia, Didi desembarcou em uma Copa do Mundo com a responsabilidade de ser um dos pilares da Seleção Brasileira na busca por um novo título. O atacante Amarildo contou como era o convívio com o meia.

- Didi sempre foi uma pessoa muito afetuosa. Nunca o vi de cara amarrada. Além disto, sempre foi uma pessoa muito educada. Tanto no Botafogo quanto na Seleção Brasileira, foi um prazer usufruir da ajuda dele dentro e fora de campo - afirmou.

O "Possesso", que no decorrer do Mundial do Chile teve a missão de substituir Pelé (lesionado no empate sem gols com a Tchecoslováquia), contou que ganhou um trunfo neste período no escrete canarinho.

- A Seleção era formada por muitos colegas meus de Botafogo. Além do Didi, tinha o Mané (Garrincha), Zagallo, Nilton Santos... E eu entrei logo em um jogo difícil, no qual o Brasil tinha chance de ser eliminado para a Espanha. Contar com colegas como o Didi me ajudou a ter ainda mais segurança de entrar em campo e fazer meu jogo - declarou, ao recordar o jogo no qual marcou dois gols na vitória por 2 a 1, de virada, sobre os espanhóis.

Com a vitória por 3 a 1 da Seleção sobre a Tchecoslováquia na final, o "Príncipe Etíope" ganhou seu bicampeonato mundial. E, ao fim do ano, saboreou mais um título: o Carioca, pelo Botafogo.

MARCANDO ÉPOCA COMO TÉCNICO NO FUTEBOL PERUANO

Didi (Peru)
'Era muito metódico e objetivo ao passar o que queria da gente', diz o Héctor Chumpitaz, defensor da seleção do Peru em 70 (Foto: Reprodução)

Após ter sido "jogador-treinador" em clubes como Sporting Cristal, no próprio Botafogo, no Veracruz (MEX) e pendurar as chuteiras no São Paulo, Didi passou definitivamente para a beira do gramado. De volta ao Peru, ele conduziu a o Sporting Cristal ao título nacional em 1968, ao bater o Juan Aurich por 2 a 1 no jogo extra, com dois gols de Alberto Gallardo.

Logo em seguida, o "Príncipe Etíope" foi designado para comandar a seleção peruana na luta por uma vaga na Copa do Mundo. Então zagueiro de "Los Incas", Héctor Chumpitaz detalhou a intensidade do trabalho de Didi.

- Ficamos seis meses concentrados, muito empenhados em conseguir a classificação nas Eliminatórias. O Didi era muito metódico e objetivo ao passar o que queria da gente. Isto, aliado ao intenso período de treinamento que tivemos, contribuiu muito para que chegássemos com muita força na reta final - afirmou.

O ex-defensor destacou como foi a luta da seleção peruana.

- Tínhamos vencido a Argentina, mas tropeçado na Bolívia em La Paz. Então fomos para a segunda partida contra os bolivianos com muita gana. Ganhamos por 3 a 0 e aquilo nos deu mais vibração para enfrentar os argentinos na Bombonera. Fizemos um jogo forte contra eles, Ramírez marcou dois gols e só não ganhamos porque o árbitro marcou um pênalti para os argentinos no último minuto. Para nosso alívio, o empate em 2 a 2 dava o primeiro lugar do grupo - e, em seguida, assegurou:


- Disputar as Eliminatórias é muito mais tenso que o Mundial. A gente sabe o quanto cada jogo pode custar caro, e a responsabilidade estava maior nas nossas costas - completou.   

E NO MEIO DO CAMINHO, TINHA UMA SELEÇÃO CANARINHO...

Brasil 4 x 2 Peru - Copa de 1970
'Fomos derrotados, mas ficou a lembrança da grande seleção que formamos', diz o ex-zagueiro peruano Chumpitaz (Foto: Reprodução)

No México, a seleção comandada por Didi caiu no Grupo 4, com Bulgária, Alemanha Ocidental e Marrocos. Porém, a intensidade da equipe que tinha nomes como Ramírez, Gallardo e Cubillas não demorou a aparecer nos gramados.

- Estávamos bastante calejados da disputa das Eliminatórias. Com isto, chegamos muito fortes para a nossa estreia contra a Bulgária, na qual marquei um gol, inclusive (os peruanos venceram por 3 a 2). O Didi foi fundamental para nos dar uma mentalidade vencedora, uma garra e tornar nossa equipe forte - afirmou Chumpitaz.

Porém, os rumos da Copa colocaram o Peru comandado por Didi no caminho da Seleção Brasileira.

- Vínhamos de um grande desempenho contra o Marrocos, no qual o Cubillas marcou dois gols e vencemos por 3 a 0. Só que a Alemanha (na época, Alemanha Ocidental) levou a melhor sobre a gente (por 2 a 1) e calhou do Brasil nos enfrentar nas quartas - disse o ex-zagueiro.

Chumpitaz contou como o técnico aconselhou "Los Incas" a enfrentar o escrete canarinho.

- Ele era um técnico bicampeão mundial em campo, né?! Conhecia bem o trabalho, o estilo dos brasileiros. Sabia as características do Pelé, do Jairzinho, do Rivellino...  - e o ex-zagueiro foi categórico ao falar sobre a seleção do Peru:

- Fomos derrotados, mas ficou a lembrança de uma grande seleção que formamos. Tanto que na época muitos disseram que Brasil e Peru foi a melhor partida da Copa, pelo número de gols e pela bola não ter parado em nenhum momento - completou.

O Brasil venceu por 4 a 2 e seguiu seu rumo ao tricampeonato mundial. Didi, por sua vez, ficou guardado na história do futebol peruano. Depois de treinar River Plate, ele conduziu o Fenerbahçe ao bicampeonato turco e comandou o Fluminense da Máquina Tricolor ao título estadual de 1975.

Ainda rodou por clubes como Cruzeiro (onde venceu mais um estadual), Atlético-MG e Alianza Lima. Até, em 12 de maio de 2001, morrer em virtude de um câncer no fígado. Porém, sua relevância para o futebol ficou para a posteridade. 

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