Denúncias de racismo no futebol nacional em 2021 já superam ano anterior, diz diretor do Observatório
Ao L!, Marcelo Carvalho, diretor do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, diz que falta um debate amplo nos clubes e federações e lamenta desfecho do 'caso Celsinho'
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Por mais que o futebol seja considerado um esporte democrático, o combate ao racismo continua a lidar com duros empecilhos. Além de perdas de pontos e de mandos de campo serem exceções em punições, o Observatório da Discriminação Racial no Futebol indica que em 2021 o número de denúncias de injúrias raciais já superou o ano anterior: são 51 casos, contra 31 relatados em 2020. Ao LANCE!, o diretor do Observatório, Marcelo Carvalho, detalha com lamento aspectos para serem refletidos no Dia da Consciência Negra.
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- É um aumento que não nos surpreende, pois a pandemia acarretou em uma interrupção no futebol e durante muitos meses, houve jogos com portões fechados. Porém, à medida que o público retornou aos estádios, a impressão é de que as injúrias raciais voltaram com mais força - disse.
Segundo o diretor do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, o número ficou elevado em especial nos últimos três meses. O órgão monitora os casos e consulta autoridades desportivas, que definem se levarão adiante em julgamento.
Carvalho elenca alguns aspectos para este aumento de denúncias.
- Vivemos em um momento conturbado, com discurso de ódio aflorado. Mas, ao mesmo tempo, hoje acompanhamos maior conscientização tanto de grupos de torcedores mas também de jogadores - e destacou:
- Alguns anos atrás, provavelmente não veríamos uma atleta do Corinthians não iria falar sobre a injúria racial que sofreu durante um jogo (Adriana foi chamada de "macaca" por uma adversária do Nacional-URU em jogo válido pela Libertadores Feminina). Vemos jogadores cada vez mais perdendo o receio de denunciarem quando sofrem racismo - completou.
Aos olhos do diretor do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, também há uma evolução para mudanças de comportamentos em estádios.
- A pauta de racismo não é mais debatida somente atrelada a datas como o Dia da Consciência Negra. Em alguns clubes, são promovidas palestras. Há debate entre grupos de torcedores, percebemos um aumento de conscientização coletiva em torno de temas como racismo e outros preconceitos como machismo e homofobia - declarou.
'CASO CELSINHO': GOSTO AMARGO COM RESOLUÇÃO DO PLENO DO STJD
O fato do Pleno do STJD "devolver" ao Brusque os três pontos perdidos por uma injúria racial contra o meia Celsinho, do Londrina, também foi vista como controversa por Marcelo Carvalho. O diretor do Observatório da Discriminação Racial no Futebol apontou contradições.
- No lado prático, o Brusque perderá mando de campo e será multado. Mas no ponto de vista simbólico, de toda uma luta por um movimento antirracista, a impressão é que o clube foi absolvido ao ter seus pontos devolvidos. Mesmo que fique registrada a pena mais branda, o Brusque conseguiu ter os pontos de volta na Série B - disse.
De acordo com Carvalho, o julgamento do Pleno do STJD trouxe um sinal preocupante para casos de racismo.
- O que acontece sempre no futebol tem uma projeção muito grande. Quando vemos em um tribunal esportivo pessoas relativizarem o racismo, a luta para que a discriminação seja combatida fica enfraquecida. A dor não é pelo grito, pelo xingamento ou piada de um torcedor ou dirigente em um estádio. Essa dor tem reflexo, que é o genocídio da população negra - afirmou, ressaltando:
- É lamentável que torcedores sigam cometendo atos racistas e saindo impunes também na esfera desportiva. O torcedor é uma pessoa como outra qualquer. Mas o papel dos clubes também é importante neste momento para promoverem pautas antirracistas - completou.
No Dia da Consciência Negra, Marcelo Carvalho traça alguns caminhos para pôr fim ao preconceito.
- É fundamental que os clubes debatam inclusive internamente pautas antirracistas. Quem relativiza os xingamentos só vai compreender de fato o que é discriminação quando ouvir depoimentos de colegas deles. Quando compreenderem que não é só um insulto ou xingamento, mas também que é a dor do ofendido. Que há uma desigualdade racial, que a discriminação leva 45% dos jovens negros até 29 anos (de acordo com dados da OMS de 2020) a cometerem mais suicídios que os brancos. O que pensam que é uma provocação na verdade afeta uma população - disse.
O diretor do Observatório da Discriminação Racial no Futebol aponta a urgência de um debate amplo do tema nos gramados.
- Temos de levar esta conscientização também para dentro das Federações e dos tribunais de justiça desportiva de cada local. Não basta um ato de racismo levar o clube a ser julgado e penalizado. Todos têm de estar cientes do quanto o racismo precisa ser combatido!
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