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‘O futebol mudou muito’, por José Inácio Werneck

Alphonso Davies - Bayern de Munique
Alphonso Davies pode ser sensação na Copa do Qatar (Foto: Divulgação / Bayern de Munique)

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Mudou tanto que, pela primeira vez desde 1986,  o Canadá classificou-se para a Copa do Mundo.

Não apenas se classificou, mas se classificou com antecedência,  em primeiro lugar na CONCACAF, à frente de México e Estados Unidos - que, por sinal, ainda não estão classificados.

Aquele longínquo ano de 1986 tinha sido, por sinal, a primeira e, até o momento, única vez que os canadenses tinham se classificado para uma Copa do Mundo.

Agora, não apenas os homens canadenses estão classificados para a Copa no Qatar mas as mulheres canadenses são as atuais campeãs olímpicas de futebol.

A seleção canadense que apareceu no México para a Copa do Mundo de 1986 era composta de 11 jogadores de sobrenomes, quase todos, tipicamente ingleses, mesclados com um ou outro italiano ou eslavo. Todos caras-pálidas.

A atual seleção canadense tem oito negros, um moreno e dois brancos, sendo um deles e goleiro Milan Borjan, de 1,95m, nascido na Croácia (quando ainda era parte da antiga Iugoslávia).

Seu nome mais ilustre é Alphonso Davies (outro negro), que é titular do Bayern de Munique mas está no momento ausente da seleção canadense por causa de complicações causadas pelo Covid-19.

O técnico da atual seleção canadense é um inglês, John Herdman, que, até onde eu saiba, nunca jogou futebol profissionalmente mas fez um curso para treinador e depois foi trabalhar na Nova Zelândia.

Um caminho bem diferente do tradicional, mas é por isto mesmo que o futebol de hoje tornou-se diferente daquele que era jogado quando o Canadá pela última vez se classificou, em 1986.

Hoje o futebol é cada vez mais dominado por números, a tal ponto que estamos começando a ver uma época em que os homens que consultam tais algarismos nos clubes - os analistas de desempenho - estão se tornando mais importantes do que os técnicos (que, por sua vez, já de algum tempo para cá, tinham se tornado mais importantes do que os jogadores).

É por isto que hoje estamos na era do que chamo de track-and-field football. Uma influência daquele outro futebol, o Futebol Americano, em que a capacidade física, o atleticismo de um jogador, é o que eles denominam "paramount". O sumo, o supremo, o mais importante.

Transportado a um campo de nosso futebol, o soccer, isto significa que, se um candidato a, por exemplo, ponta direita, correr a distância de cem metros em 12 segundos mas um outro, menos dotado de habilidade natural com a bola, cobrir o mesmo percurso em 11 segundos - vocês podem ter certeza de que o preferido dos analistas  e,  em consequência, dos técnicos, será o mais veloz. 

Em outras palavras, Garrincha, com suas pernas tortas, hoje não teria vez.

Aquela seleção canadense que apareceu na Copa de 1986 disputou três partidas e não conseguiu marcar um único e solitário gol. Foi derrotada pela França por 1 a 0, pela Hungria por 2 a 0 e pela então União Soviética por 2 a 0.  Voltou virgem para casa.

Veremos o que a atual poderá fazer no Qatar.

Mas que o futebol mudou muito, não tenham dúvidas.


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